Da viagem de São José e Maria Santíssima a Belém, onde nasceu Jesus
Ascendit autem et Ioseph … in civitatem David, quae vocatur Bethlehem— “Subiu também José … à cidade de Davi, que se chama Belém” (Lc 2, 4)
Sumário. Consideremos os doces colóquios dos santos Esposos sobre o mistério da Encarnação, durante a viagem de Nazaré a Belém. Imaginemos a tristeza de São José vendo-se com Maria expulso de Belém e obrigado a refugiar-se numa gruta. Mas a tristeza se trocou em alegria, quando o Patriarca ouviu o doce canto dos anjos, viu o Filho de Deus feito menino, e os pastores e os magos prostrados em adoração. Unamos os nossos afetos ao de São José e admiremos como o Senhor alterna as alegrias com as tristezas na vida dos justos.
I. Considera com que ternura Maria e José deviam entreter-se naquela viagem, sobre a misericórdia de Deus, que manda seu Filho à terra para Redenção do gênero humano; e sobre o amor do Filho, que quer vir a este vale de lágrimas, a fim de satisfazer com sua paixão e morte pelos pecados dos homens. Considera também a aflição de José, que na noite em que devia nascer o Verbo divino, se viu com Maria expulso de Belém, de modo que foram obrigados a se refugiarem numa gruta. Qual não deve ter sido a sua dor, vendo sua santa Esposa, jovem de quinze anos, próxima a dar à luz, tremer de frio naquela gruta úmida e aberta de todos os lados?
Mas, qual não deve ter sido em seguida a sua consolação, quando ouviu Maria chamá-lo e dizer-lhe: Vem, José, vem adorar o nosso Deus-Menino, que já nasceu nesta gruta. Vê como é formoso; vê nesta manjedoura sobre um pouco de palha ao Rei do universo. Vê, como está tremendo de frio aquele que abrasa os Serafins de amor. Vê como está chorando aquele que é a alegria do paraíso. Contempla aqui, meu irmão, qual deve ter sido a ternura e amor do santo Patriarca, quando, com os seus próprios olhos viu o Filho de Deus feito menino, e ao mesmo tempo ouviu os anjos cantarem em torno do seu Senhor nascido, e viu a gruta resplandecente de luz.
Então José, de joelhos, e derramando lágrimas de ternura, disse: Adoro-Vos, meu Senhor e meu Deus. Que felicidade minha é a de ser o primeiro, depois de Maria, a Vos ver nascido, de saber que nesta terra quereis ser chamado meu filho, e tido por tal. Permiti, pois, que eu também assim Vos chame, e desde agora Vos diga: Meu Deus e meu Filho, consagro-me todo a Vós. A minha vida não será mais minha, será toda vossa, e não me servirá mais, senão para Vos servir, ó meu Senhor. Como ainda aumentou a alegria de São José, vendo naquela noite virem os pastores convidados pelo Anjo a adorarem seu Salvador nascido; e depois também os santos Magos, que chegaram do Oriente para tributarem as suas homenagens ao Rei do céu, vindo à terra para salvação das suas criaturas.
II. Une os teus afetos aos dos Pastores e dos Magos, ou, melhor ainda, aos de São José mesmo e de Maria, sua Esposa imaculada. Depois reflete no que diz São João Crisóstomo, quando fala das dores e das alegrias do santo Patriarca: Misericors Deus moestis rebus etiam iucunda permiscuit. Na sua infinita misericórdia e sabedoria, o Senhor dispôs que a vida do justo seja uma alternação de aflições e de alegrias; e se não permite que seja oprimido pelas tribulações, tampouco quer que ande sempre por entre gozos.
Meu santo Patriarca, pela dor que sentistes em ver o Verbo divino nascido numa gruta, tão pobre, sem fogo e sem paninhos, como também em o ouvir chorar pelo frio que o atormentava, Vos rogo que me alcanceis uma dor sincera dos meus pecados, que foram causa das lágrimas de Jesus. E pela consolação que tivestes em ver pela primeira vez a Jesus nascido no presépio, tão formoso e gracioso, que desde então vosso coração começou a arder de um amor mais ardente para com o Menino tão amável e tão amoroso, alcançai-me a graça de o amar com amor ardente na terra, a fim de ir um dia gozá-lo no paraíso.
E vós, ó Maria, Mãe de Deus e minha Mãe, recomendai-me a vosso Filho, e alcançai-me o perdão de todas as faltas que tenho cometido, e a graça de não mais o ofender. Ó meu amado Jesus, perdoai-me pelo amor de Maria e José, e dai-me a graça de um dia Vos ver no céu, para Vos louvar e amar a vossa divina beleza e a bondade que Vos fez nascer criança por meu amor. Amo-Vos, bondade infinita; amo-Vos, meu Jesus; amo-Vos, meu Deus, meu amor, meu tudo; e não Vos peço outra graça, senão a de Vos amar com todas as minhas forças, † Jesus, Maria, José, eu Vos dou o meu coração e o meu espírito (1).
Referência: (1) Indulgência de 100 dias cada vez.
(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa Inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 472-475)
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